Arrogância, impaciência e ansiedade são os maiores defeitos da geração Y
Arrogância, impaciência e ansiedade são os maiores defeitos da geração Y
Essa é a opinião de especialistas, de chefes e de recrutadores
Qual o maior erro da geração Y? Na visão de especialistas, é chegar às empresas achando que sabe de tudo e, por isso, considerar que merece alcançar logo cargos de liderança. O resultado é que esse perfil jovem é impaciente e arrogante e tem dificuldade de ouvir os colegas mais velhos e de respeitar a hierarquia e as regras
A geração Y têm bastante a oferecer ao mundo corporativo: os nascidos entre 1982 e 1995 têm familiaridade com a tecnologia, adaptabilidade em relação às mudanças do mercado e facilidade para desempenhar muitas tarefas ao mesmo tempo.
Propósito é uma das palavras-chave: os millenials acreditam que o trabalho precisa ter conexão com as crenças e os valores deles. Entretanto, as pessoas da geração que cresceram com a aceleração da transmissão de informação sofrem com a pressa, a ansiedade, a imaturidade e o pensamento de que são “especiais”.
No meio corporativo, os problemas causados por isso têm chamado a atenção de chefes e recrutadores. Na visão de Tarsia Gonzalez, presidente do conselho da companhia de transportes Transpes, “o maior erro dos integrantes dessa faixa etária é chegar às empresas achando que sabem tudo”.
O resultado, segundo a psicóloga e especialista em liderança e alta performance, gestão de pessoas, planejamento estratégico e governança corporativa, é que os jovens podem negligenciar a experiência de colegas com mais tempo de casa e, assim, acabam tendo problemas para aceitar conselhos e respeitar a hierarquia e as regras.
Segundo Bráulio Lalau, 38, CEO da empresa de processamento de cartões de crédito Orbitall, outro traço marcante que leva a esse tipo de comportamento é o individualismo. Tudo isso corrobora para os choques entre gerações nas firmas.
Sem humildade e com a autoestima lá em cima, esses trabalhadores acreditam que merecem uma posição melhor — e logo! “Muitos chegam ao ambiente de trabalho e querem alcançar rapidamente os cargos mais altos e não têm a noção de que, para isso, precisam de vivência e de hábito com a cultura corporativa da organização”, comenta o administrador de sistemas de informação.
“As empresas precisam desses jovens, pois são multitarefas, superconectados e sabem trabalhar com muita informação. Contudo, a ansiedade pode atrapalhar”, acrescenta. Ele também percebe que a geração Y tem dificuldade de respeitar as culturas organizacionais das companhias e que ficam facilmente insatisfeitos com o trabalho, o que ocasiona maior rotatividade entre esse público.
“Dessa forma, os jovens perdem a chance de criar uma rede de contatos e de desenvolver competências administrativas, essenciais para chegar a postos de liderança”, observa. É o que também percebe a administradora com foco em RH Adriana Pavlakis, 43.
Diretora de Desenvolvimento Organizacional da Pixeon, empresa de softwares para a área da saúde, ela elege o imediatismo como o principal defeito da geração. “O maior desafio na nossa companhia hoje é a retenção desses profissionais. Eles não têm muita clareza de que uma carreira não é formada só com competência técnica e que precisam de experiência”, diz.
“Não adianta ter um diploma de Harvard sem prática. Entrevistei jovens de 21 anos que logo perguntam em quanto tempo virariam diretores”, conta. Por esses motivos, há empresas mais tradicionais que ficam com o pé atrás na hora de contratar pessoas dessa faixa etária. Na concepção de Adriana, as startups são as que mais preferem esse perfil no quadro de empregados — afinal, em geral, também foram criadas por pessoas desse grupo.
Startups
Educadora física e mestre em engenharia biomédica pela Universidade de Brasília (UnB), Fernanda Teles, 27 anos, por exemplo, abriu, há um ano, em parceria com um sócio, a startup E-sporte, que une saúde e tecnologia para oferecer soluções para o mercado. Um dos principais produtos é o E-lastic, kit de elásticos e acessórios para exercícios que orienta e mede o desempenho por meio de um aplicativo de celular.
Atualmente, a empresa tem oito empregados. “Todos são da geração Y, o que é ideal para nós. São pessoas que nasceram com a tecnologia e se adaptam às mudanças”, elogia. Como exemplo da capacidade de adaptação, Fernanda cita a si mesma.
“Eu sou formada em educação física, me meti com engenharia e hoje atuo na área comercial da E-sporte”, ilustra. Na opinião da empresária, os jovens pensam mais fora da caixa. “E é disso que as startups precisam.
O modelo tradicional acaba se tornando tedioso para nós. Se as companhias não entenderem e não se adaptarem a esse novo perfil, vão perder a oportunidade de ter a contribuição de profissionais inovadores e criativos”, afirma.
E a crise?
A rotatividade dos millenials, em geral, é considerada alta, mas uma pesquisa da multinacional de auditoria e consultoria Deloitte revelou que essa tendência tem mudado no Brasil por causa da crise econômica.
“Agora, a geração Y tem procurado mais estabilidade”, comenta Fernanda Mendes, 43, gerente de Desenvolvimento da Deloitte. O estudo entrevistou 8 mil pessoas nascidas a partir de 1982 em 30 países, incluindo o Brasil, empregadas em tempo integral em firmas de grande porte (com mais de 100 funcionários).
A análise mostra que 34% dos entrevistados brasileiros têm a intenção de permanecer por mais de cinco anos no emprego atual. Na mesma pesquisa feita ano passado, esse percentual era de 28%. No âmbito global, esses números evoluíram de 27%, em 2016, para 31% este ano.
Administradora de empresas, Fernanda percebe que esses trabalhadores buscam empresas que não almejam só lucro e estão envolvidas com algum propósito. Também existe uma preferência por organizações que ofereçam mais liberdade.
“Eles gostam de flexibilidade de horários e valorizam mais resultados do que horas cumpridas”, completa. E o estudo corrobora: globalmente, 84% dos entrevistados trabalham em uma companhia que tem algum grau de trabalho flexível.
Além disso, 39% dizem que suas organizações propiciam ambientes altamente flexíveis. Entre esses, a diferença entre os que se veem saindo da empresa dentro de dois anos (35%) e os que pretendem ficar além de cinco anos (33%) é de apenas dois pontos percentuais. Entre aqueles que dizem estar em organizações menos flexíveis, essa diferença é de 18 pontos percentuais (45% e 27%, respectivamente).
As qualidades
Apesar dos defeitos, os integrantes da geração Y são fundamentais para o mercado de trabalho, segundo Adriana Pavlakis, da Pixeon. “Eles são rápidos, sabem mais de tecnologia, têm muita energia e rompem com o conservadorismo dos mais velho”, observa.
A interação com esse perfil de trabalhador pode trazer bons resultados, desde que eles saibam ter limites (como respeitar a hierarquia). Bráulio Lalau destaca que os membros dessa faixa etária são menos disciplinados que os integrantes da geração X e do que os baby boomers, mas, em compensação, têm outros atributos.
“Capacidade para inovar e visão global são duas virtudes essenciais desses jovens. Para eles, o mundo não tem barreiras geográficas e muitos dominam idiomas estrangeiros.”
Para aproveitar o potencial dos millenials sem deixar que os traços negativos atrapalhem o processo, Bráulio comenta que há empresas apostando em programas de treinamento com bons resultados. A tendência tem impactado o mercado.
“Nos últimos anos, houve aumento de 40% no número de organizações com equipe dedicada somente à educação corporativa”, aponta Adriana Pavlakis. Talvez por isso, cada vez mais membros da geração Y percebem as vantagens desse tipo de iniciativa.
“O salário não é mais o fator preponderante para eles na hora de escolher uma vaga de emprego. Eles querem, em primeiro lugar, desenvolvimento da carreira. Depois entram clima organizacional saudável, boa liderança, benefícios e, por último, a remuneração”, enumera.
E como é a geração Z?
Uma nova geração está chegando no mercado. Depois da geração Y, é a Z que vai trazer novos desafios. Nascidos entre 1995 e 2010, os nativos digitais comporão cerca de 20% da massa de mão de obra mundial até 2020, de acordo com Bráulio Lalau. “Eles são mais pé no chão: não mudam de emprego com tanta facilidade, entendem mais de construir uma carreira que a geração Y e são mais ambiciosos na busca de cargos gerenciais”, completa. Honestidade e clareza serão virtudes que esses jovens mais exigirão dos chefes deles.
Conselhos para os millenials
Tarsia Gonzalez, presidente do conselho administrativo da Transpes, elencou dicas para a geração Y:
“Não entre achando que sabe de tudo!”
A geração Y é mais rápida do que as anteriores. Ela cresceu com a tecnologia e é acostumada a acessar tudo imediatamente. Daí o resultado é impaciência e arrogância. Por serem mais questionadores, os integrantes do grupo também têm mais dificuldade de seguir regras. Falta a eles entender que mudanças são bem-vindas, mas existem a hora e a maneira certas de falar.
“Hierarquias e regras são para serem respeitadas, sim!”
Hoje em dia, as estruturas familiares apresentam regras cada vez menos rígidas e os jovens acabam achando que o ambiente de trabalho também será assim. O desafio de chefes e colegas é aprender a domá-los.
“Não negligencie o que a empresa tem”
É preciso respeitar a cultura organizacional e os veteranos da empresa. Eles estão na companhia há mais tempo e sabem mais sobre o trabalho.
“Peça ajuda. É mais difícil aprender sozinho”
Em um mundo competitivo, é comum sentir vergonha de assumir que não sabe de algo e pedir ajuda a alguém. Só que buscar auxílio dos colegas ou do chefe não é problema, pelo contrário: é o melhor a fazer.
“Saiba que angariar conhecimento real leva tempo”
Há casos de jovens assumindo o comando de empresas, mas são exceções. Em geral, leva mais tempo para chegar lá. Adquirir conhecimento é um trabalho árduo e passamos a saber de muita coisa apenas com a prática.
Falem, jovens
Confira o que integrantes da geração Y têm a dizer sobre as características da faixa etária
Victor Silveira, 24 anos, mora no Park Way, estuda engenharia civil no Centro Universitário de Brasília (UniCeub) e concorda com a análise dos especialistas entrevistados pelo Trabalho & Formação Profissional. “A gente é muito precoce. Chegamos ao mercado de trabalho querendo conquistar tudo e mal temos experiência para isso: ainda cometemos erros básicos”, admite. Ele foi estagiário nas Organizações Paulo Octávio por dois anos, quando conta ter aprendido bastante sobre obras e ter desenvolvido habilidades gerenciais e a respeitar hierarquias. O segundo estágio, onde continua atualmente, é na Roque1, empresa do ramo na Cidade Ocidental, Goiás. “Eu quero me desenvolver na área de gestão de pessoas porque acho fundamental saber lidar com perfis de diferentes níveis de formação e otimizar os rendimentos”, afirma.
Moradora de Ceilândia e administradora pelo Centro Universitário do Distrito Federal (UDF), Pryscylla Sousa, 24, está atualmente desempregada, mas acumula experiência como analisa de suporte comercial na Telefônica Brasil e como estagiária na Agência Nacional de Telefonia (Anatel). A ambição dela é alcançar um cargo gerencial, pois acredita que tem mais aptidão para eles. “Não acho que a geração Y chegue ao mercado achando que sabe tudo ou querendo progredir com tanta pressa. Não podemos generalizar. Eu, por exemplo, almejo um cargo de liderança e quero ter conhecimento de todos os processos até chegar lá”, diz. Questionada sobre as características da geração Y, é enfática: “Nós somos mais práticos, multitarefas e inovadores”. Durante a primeira experiência profissional dela, no estágio, admite ter tido dificuldade de se adaptar ao uso de roupas mais formais.
Estudante de direito do UniCeub, Marcello Lopes, 22, é estagiário da Fundação dos Economiários Federais (Funcef) há quatro meses. A maior dificuldade dele, no momento, consiste em conciliar as aulas e trabalhos da faculdade com a prática profissional. Ele sonha abrir o próprio escritório de advocacia futuramente e, para ter essa autonomia, percebe que precisa desenvolver habilidades em gestão de pessoas. O estudante se define como pontual e organizado e alega não ter dificuldade de de relacionar com colegas mais velhos. “Eles que estão precisando se adaptar a uma nova linguagem e às novas ferramentas, muitas das quais muitas eu já conheço”, completa. Marcello se opõe à análise de que os membros da geração Y são presunçosos e imediatistas. “Discordo, considerando a minha experiência. Na minha condição de estagiário, estou ali pra aprender. Tampouco noto isso nos meus colegas de trabalho.”
*Estagiário sob a supervisão de Ana Paula Lisboa
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